sexta-feira, janeiro 26, 2007

AMARGO

- você não! temos que verificar umas coisas ainda.
ele percebeu na hora que estava sendo barrado por suas feições. apenas por isso. seus irmãos acabaram de entrar. ele não.
de dentro da guarita, com seus documentos, olhavam para ele, repetidas vezes.
voltaram com sua identidade na mão. perguntaram de novo seu nome. nome de seus pais. data de nascimento. como se fosse falsa. como se ele talvez não soubesse os dados que ela continha. como se ela não fosse dele.
e ele sentiu, mais uma vez, o gosto amargo da discriminação.
sacou o celular, ligou para o organizador do evento, comunicou o que ocorria.

um pequeno corre-corre, o interfone tocando na guarita, um dos guardas de olhos arregalados, um outro segurança vindo correndo lá de dentro...
abrem a porta, e ele ouve, de um deles:
- desculpe excelência, foi um engano, desculpe, desculpe....

e ele pensou, de "você" passou a "excelência". não ficou enraivecido com os seguranças, foram treinados por seus patrões para serem assim. muitos dos antigos capitães do mato eram afro-descendentes....

e ele sabia que passara por isso apenas pelas suas feições. não rea nem um pouco confortável ter feições árabes num mundo pós 11 de setembro, e tentar adentrar um consulado americano. e enquanto ele subia os degraus da escada da frente, pensava em quantas situações semelhantes não estariam passando os negros brasileiros, cotidianamente, diariamente, a cada hora.

o gosto amargo da discriminação não tem cor. é universal.